quinta-feira, 25 de dezembro de 2008

"vou assentar arraiais em Câmara de Lobos para combater esse inimigo infiltrado, a bengala do PSD, que domina metade do PS (...)"



















O famoso deputado do Assembleia Legislativa da Madeira eleito pelo Partido da Nova Democracia, José Manuel Coelho (na imagem, ao seu mais alto nível), anunciou que vai arrumar as botas. A partir de 1 de Janeiro, cessa funções. É pena. Mas o homem diz-se "fatigado das grandes lutas que o PND travou nos últimos tempos". Coitado. É tempo do seu merecido descanso. Que descanse bem, pois a Democracia na Madeira e em Portugal - e, porque não, no Mundo - precisa dele activo e interveniente. Ele, de resto, como é seu apanágio, não foge com o peito às balas: "vou assentar arraiais em Câmara de Lobos para combater esse inimigo infiltrado, a bengala do PSD, que domina metade do PS (...)". O futuro ex-deputado não se coíbe de chamar as coisas pelos nomes, e fá-lo com um palavreado que importa reter. Na verdade, importa também observar-lhe a figura, o semblante, reparar no nariz, na careca, na estatura; e ouvir-lhe a voz, especialmente o tom, o sotaque; e conhecer-lhe as acções de protesto no parlamento madeirense, desde o relógio de cozinha à bandeira nazi. Porque cada uma destas particularidades, por si ou em conjunto, fazem com que seja muitíssimo difícil levar este senhor Zé Manel a sério (o próprio nome presta-se a isso).
Mas que importam a sua fraca figura, o folclore rasco do seu discurso, o dramatismo exagerado dos seus protestos? Importam, digo eu, muito pouco - se lhes extraírmos (ao discurso e aos protestos me refiro) aquilo que de valor lhes está subjacente; por exemplo: "defendemos uma alternância democrática de poder na Madeira porque temos um governo com 30 anos, como nos países africanos"; "dos tribunais não podemos esperar nada e o Ministério Público é outra desgraça que arquiva tudo o que a Polícia Judiciária investiga contra o regime"; "[temos de combater os] patos bravos que estão a destruir o património natural, os responsáveis municipais que estão feitos com os empreiteiros que constroem indiscriminadamente, verificando-se uma anarquia completa da paisagem"; "[queremos incentivar] as pessoas a deixarem de ter medo e a dizerem o que realmente pensam".
Será certamente muito difícil desmentir a pertinência e validade disto que aqui se cita. De resto, já há muito que se tornou comum associar o Governo Regional da Madeira a atentados contra a liberdade na ilha e o novo democrata pouco acrescenta a isso.
Além disso, a urgência dalguns destes assuntos é igualmente verificável em Portugal continental, particularmente no que diz respeito ao ordenamento de território e à impotência da justiça. Quanto à alternância no poder, enfim, a diferença não é abismal, mas será concerteza muito rebuscado comparar a situação que cá se vive à de alguns países africanos eleitos democraticamente (ou não?); quanto ao sentimento de medo, enfim, sempre vamos presenciando algumas situações preocupantes, mas parecem nunca ser suficientes para que nos revoltemos definitivamente.
Logo, qualquer sinal de inconformismo e luta são bem-vindos. Dará o futuro ex-deputado eco perfeito à voz popular? Talvez sim. E, se sim, estará a cumprir (coisa rara entre os membros desta classe) a sua função.
Por tudo isto, volto ao princípio: é pena que o deputado José Manuel arrume as botas.
Mas, enfim, nada mais.

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