segunda-feira, 12 de junho de 2017

Gil Canha tem um problema - mas não é com Paulo Cafôfo, é com a Democracia. Por João Pedro Vieira


À primeira lê-se e não se acredita; à segunda percebe-se, discorda-se, mas aceita-se: Gil Canha não é o que muitos como eu julgavam ser e qualquer razão que pudesse ter no passado, perdeu-a pelo caminho.
Não há duas formas de olhar para as entrevistas em que Gil Canha se multiplica nos ataques à actual equipa da Câmara Municipal do Funchal, há uma só, porque são ambas a face da mesma moeda - e a única atitude honesta perante isso é a denúncia da demagogia, do populismo e do infeliz papel a que Gil Canha se presta, ao serviço de qualquer coisa que desconhecemos, mas que facilmente compreendemos.
Se dúvidas existissem sobre isso, basta um exercício rápido de comparação entre essas duas entrevistas para concluirmos o óbvio:

- A 3 de Março, no JM, Gil Canha era, nas palavras do próprio, um “bicho político”; hoje, no DN, é um técnico e da sua equipa só farão parte técnicos;


- A 3 de Março, Alberto João Jardim e Miguel Albuquerque estavam para a Madeira como Salazar e Marcelo Caetano para o país; hoje, os dois podiam fazer parte do seu grupo de férias, a bordo de um qualquer cruzeiro;


- A 3 de Março, o poder de Alberto João Jardim era “autocrático” e “ditatorial”; hoje, era capaz de “rir um pouco” com Alberto João e o seu “sentido de humor”; 


- A 3 de Março, Albuquerque era a “evolução na continuidade” de Alberto João Jardim, era a “rapinagem agora de fraque e luva branca”; hoje, é alguém com quem passar férias, apesar dos “desentendimentos” pontuais;


- A 3 de Março, o “maior mentiroso” da Madeira era Michael Blandy e o DN estava “bem que pior que o JM do tempo de Jardim”; hoje, Gil Canha dá uma entrevista ao DN e acaba por ser capa contra Cafôfo numa entrevista em que diz que não as há;

- Hoje, na mesma entrevista, Gil Canha fala dos “laivos de corrupção” do tempo de Albuquerque e Rubina Leal, mas não resiste a um elogio à “trabalhadora incansável”, que merece o reconhecimento de toda a gente. Porque nesse tempo, aí sim, havia preocupação com o “alindamento da cidade” - e, já agora, das contas também.
Honra lhe seja feita, num ponto Gil Canha mantém a coerência: na demonstração da motivação que o move, que não é, como diz e bem, o benefício da cidade, mas a destruição de Paulo Cafôfo. Como dizia a 3 de Março, o que importa é “fazer tudo para o Sr. Cafôfo não vencer a Câmara”.
Nessa sua batalha justiceira, Gil Canha acaba, como todos os populistas, apanhado na sua própria rede de demagogia: critica o populisno, mas utiliza como arma a mais populista de todas elas - a acusação de que todos são corruptos, menos o próprio; coloca-se num patamar acima de todos os outros, nos planos político, técnico, intelectual e moral, e acaba fuzilado pelo próprio discurso; acusa os outros de mudarem de posição, mas a sua não resiste a uma avaliação com 3 meses de distância; e, ironia do destino, acaba a entrevista de hoje a elogiar três das personagens principais de um regime que há 3 meses era “autocrático” e “ditatorial”, em nome de um partido monárquico, pelo qual se candidata num regime republicano e num sistema democrático.
Gil Canha ainda pode enganar alguns, mas como dizia o seu saudoso Alberto João Jardim, à primeira qualquer um pode cair, mas à segunda cai quem quer. Hoje, é bom saber que aquilo que nos separa é bem maior e mais profundo do que o fruto da circunstância, porque Gil Canha demonstra ser apenas mais um dos que julgam que os madeirenses não têm memória, nem critério para separar o bem do mal.
O discurso de Gil Canha passou a integrar o lote dos que não merecem a importância que julga ter e o melhor é ficarmo-nos pelo debate que vale a pena - sobre porteiros: é que a 3 de Março Cafôfo tinha uma “voz” e um “timbre” fantásticos, mas hoje já nem para porteiro serve - e eu que não sou de intrigas, antes quero voz que me abençoe que justiceiro que nos desgrace.

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