terça-feira, 2 de julho de 2013

“Choca-me a maneira como afastamos os nossos militantes” A candidatura de Albuquerque à liderança deveria ter sido encarada como natural


Sara André foi deputada do PSD durante dez anos. Sobretudo nas questões sociais, discordou da partido e acabou fora das listas. Lamenta a forma como os militantes são afastados.
Depois da actividade associativa e da Assembleia, o que tem feito nos últimos tempos? Como técnica superior da secretaria regional da Educação fui mobilizada para uma escola de 1º ciclo onde desempenho funções de apoio ao Estudo, alimentação e recreio das crianças e outras que sejam necessárias do âmbito da escola. A nível associativo sou presidente da Associação dos Antigos Alunos da Uma, e da Assembleia Geral das Associações de Basquetebol e de Surf da Madeira e faço parte da direcção da Associação de Natação da Madeira. A nível pessoal além de ser mãe a 200%, estou a iniciar um projecto empresarial.
E ao nível político? A nível político continuo a ser militante de base do PSD-M, embora sem qualquer responsabilidade partidária.
 

Como foi a passagem pela Assembleia? Foi o que esperava? No início a adaptação foi difícil. Vinha de uma experiência associativa onde havia grande dinamismo, onde o tempo parecia ser insuficiente para tudo e trabalhava sempre sob pressão. Na Assembleia o quotidiano é muito diferente. Assumimos funções deliberativas, não executamos. Discutimos e aprovamos, não fazemos.
Não foi o que esperava? A inexperiência e a idade faziam-me crer que podia mudar o mundo. Não é assim. Cresci muito politicamente e infelizmente descobri que afinal a política não é só defender os interesses da população. Dei por mim a combater contra a demagogia e a partidarite, contra diplomas da oposição sem conteúdo ou sentido prático, apenas com títulos bonitos para a opinião pública. Mas nem sempre foi assim. Conseguimos estabelecer pontes com a oposição e houve matérias importantes que foram trabalhadas com todos os partidos e que chegaram a bom termo e isso é que tem de ser ressalvado. Considero no geral, que a experiência parlamentar foi muito positiva.
Chegou a ter algumas divergências com a sua própria bancada. Como foi? Dizer que tive divergências com a bancada não é correcto, pois isso significaria que estava contra todos os meus colegas de então. Nem sempre partilhei da mesma opinião de alguns, e transmitia sempre a minha, de forma frontal e não nas costas de ninguém. Se calhar essa era a diferença.
Essa rebeldia custou-lhe a continuidade no parlamento? Não sei responder a esta questão. Terá que perguntar ao presidente do meu partido que foi quem elaborou as listas.
Sentiu-se prejudicada no PSD-M por ter manifestado opiniões que nem sempre eram as da direcção do grupo e até da liderança do partido? Sempre encarei o PSD como um partido da liberdade, onde se tinha liberdade de expressão. A minha postura foi sempre igual ao longo de dez anos em que estive no parlamento e em outras funções partidárias. Leal aos meus princípios e leal aos princípios da Social Democracia.
Lealdade não é sinónimo de seguidismo. Obviamente, para mim, lealdade não tem o mesmo significado de seguidismo cego. Não me sinto prejudicada no PSD Madeira, porque fiz muitos amigos. Sei que continuo a ter o respeito de muitos dirigentes do meu partido e de outros e da população, por ser como sou. Para mim sentir que sou respeitada e que cumpri o meu dever com competência enquanto deputada ou dirigente política, é o mais importante. Sempre acreditei que ninguém é insubstituível e na política tudo tem o seu tempo. Certamente consideraram que não era uma mais valia para o lugar que ocupava e que haveria outros mais competentes do que eu. Aceitei a saída com naturalidade.
 

Nas questões sociais assumiu posições algo críticas em relação ao Governo, foi isso que marcou a sua passagem pela Assembleia e definiu a saída? Sinceramente, quero pensar que o que marcou a minha passagem pela Assembleia foi o facto de ter sido uma deputada preocupada e competente, que se preparava para os diplomas, que ia discutir, até à exaustão. Que os defendia com um discurso baseado no respeito, na verdade e na vertente técnica dos mesmos. Não gostaria de ser lembrada como polémica, até porque acho que os deputados devem proteger a imagem da casa da autonomia como é o parlamento. Uma coisa são as actividades políticas ou partidárias em comícios e acções no seio do partido, outra coisa é a postura parlamentar.
Uma postura que nem sempre é respeitada. Devo dizer que essa postura parlamentar desejável, é assumida por muitos deputados no parlamento da Madeira.
Como vê o momento político, regional e nacional? A crise e a austeridade justificam tudo o que se está a viver? Olho para todo este momento com grande preocupação, por mim, pelo meu filho e por toda a sociedade. Para além de uma crise económica e social, vivemos uma crise de valores onde a classe política está completamente desacreditada, o que é um perigo para a nossa democracia. O problema não é a crise - a crise tem de ser vista como uma oportunidade para a mudança, para a adaptação de toda a sociedade para uma nova realidade -, o problema é a austeridade extrema que limita todas as oportunidades que a crise possa trazer. 


Que alternativas tem a Madeira, com uma dívida gigantesca e um PAEF que limita tudo? A Madeira tem de olhar para o mundo e aproveitar os bons exemplos de como a crise foi ultrapassada noutros locais. Incentivar a inovação e as boas ideias, abandonar formas de estar e procedimentos totalmente desadequados aos novos tempos, aprender a trabalhar em parceria, cooperar e abandonar a visão da “nossa quintinha”, na minha opinião, esse deve ser o caminho. Mas este esforço tem de ser feito por todos, tanto pela classe política como a empresarial e associativa. 


Uma mudança de comportamentos complicada. A sociedade tem de se unir para ultrapassar as dificuldades com esperança. Este trabalho tem de ser feito com a maior transparência e honestidade, sem demagogia ou falsas promessas. Identificar e potenciar o que a Região tem de melhor, unificar e estabelecer pontes entre os diferentes sectores. Será difícil? Sem duvida, mas acredito que com a vontade de todos, tudo é possível.
E que futuro para o PSD-M? O Partido Social Democrata na Madeira é um partido forte e como muita gente de valor. Por vezes, confesso que me choca a forma como afastamos os nossos militantes mais válidos, em favor de pessoas que sempre criticaram este partido ou que nunca nada por ele fizeram. São chamados os “isentos” ou as “vozes da sociedade civil”. Pergunto eu: os nossos militantes não são também as vozes da sociedade civil? Será que os militantes também não são pessoas isentas? 
 

É preciso agarrar os militantes válidos? É importante saber ouvir todos, mas temos de acarinhar e não deixar “fugir” as nossas mais valias, aqueles que tudo dão ou deram para que este partido se tornasse o partido da liberdade, da autonomia e que defende a Madeira e os madeirenses acima de tudo. Continuo a pensar que o futuro da Madeira passa obrigatoriamente pelo PSD-M, e que, não apenas nos momentos chave, mas sempre, nos manteremos unidos em prol desta Região. Só temos todos de trabalhar para que isso seja uma realidade.
 

Como viu a disputa interna, entre Jardim e Albuquerque? Com alguma tristeza porque acompanhei alguns contornos. Por vezes quando estamos “de fora” temos outra visão das coisas. Todos têm legitimidade para se candidatarem à liderança de um partido. Para mim não era novidade nenhuma que Miguel Albuquerque o fosse fazer, como não deveria ser para ninguém pois este anunciou que o iria fazer, mesmo antes de o dr. Alberto João ter anunciado a sua candidatura novamente. Sei que por diversas razões, posturas, atitudes, etc, o dr. Alberto João foi prejudicado por pessoas que com ele estavam mais conotadas e isso ele não merecia. Ganhou, e isso tem de ser respeitado por todos.
 

Acredita que Alberto João Jardim cumpre a promessa de sair em 2014? Não ouvi essa promessa.
Como classifica o que aconteceu, nos dois últimos anos, na JSD-M, com guerras abertas entre dirigentes, acusações, ameaças e até incidentes mais graves? É a mesma organização de que fez parte? Sinto grande tristeza por tudo o que aconteceu. “Uma vez da Jota sempre da Jota”.
Uma situação para a qual chegou a chamar a atenção. Ainda me lembro que tentei avisar o perigo que se avizinhava para o partido. Cheguei mesmo a escrever um artigo de opinião no DN “aprendiz de feiticeiro”, mas acho que ninguém imaginou as proporções que as coisas iam tomar. Eu sabia, não tinha duvidas. Uma certa experiência no movimento associativo, no partido e a visão dos comportamentos, anteviam tudo o que se passou.
Também teve as suas divergências na ‘jota’ mas nada que atingisse este nível. Foi pública a minha divergência na JSD com o presidente de então, quando era membro daquela organização, mas devo dizer que houve limites e fronteiras que nunca foram ultrapassados. No final, um certo bom senso sempre imperou o que não aconteceu nos últimos tempos. Mas penso que tudo deve ser encarado como uma lição. Temos de aprender com os erros e essa aprendizagem é que fará com que a JSD seja e se torne uma organização mais forte. A JSD-M é uma organização política que deve preparar os jovens civicamente e isso é o mais importante e o que deve ser preservado.
 

Admite regressar à política activa? Em que condições? Eu considero-me uma militante de base activa. Pago as quotas do meu partido e continuo a defendê-lo. Mais do que as pessoas, o importante são os valores. O voltar a desempenhar funções, sejam elas quais forem, naturalmente, não depende de mim, mas de quem faz as escolhas. A disponibilidade depende, simplesmente, dos projectos que são apresentados e da liberdade de se poder trabalhar de acordo com o que acreditamos.
Fonte: DN Madeira

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