sexta-feira, 18 de maio de 2012

A máquina de lavar. São 30 anos a tirar as nódoas do governo. O segredo está no branqueamento. Nas lavagens cerebrais

Soubemos pelo porta-voz da comissão política do PSD-Madeira que os madeirenses poderão estar à beira da “revolta” e da “autodeterminação”. Por breves segundos presumi que o vaticínio não poderia estar mais acertado, atendendo à bordoada fiscal que nós, madeirenses, estamos a levar só para permitir, a quem nos conduziu à beira do abismo, tapar buracos financeiros abertos por um governo viciado em mostrar obras de betão armado e a servir banquetes de espetada e vinho seco, nas inaugurações e nos comícios, endividando a alma do povo para somar vitórias em sucessivas reeleições. Mas eis que, afinal, a propalada “revolta” tem como alvo, não propriamente quem governa estes rochedos basálticos mas aquele que, em Lisboa, ocupa o lugar do eterno inimigo externo da Madeira, o tal Governo da República, que já foi centralista, colonialista e fascista, mas que agora é um déspota porque não respeita o Estatuto político-Administrativo da Madeira nem cumpre o programa de ajustamento económico e financeiro.
E vem então o senhor deputado, advogado e empresário, porta-voz da tal comissão política, lacrimejar, quem nem um crocodilo, à frente das câmaras de televisão. Logo ele, daquela única bancada parlamentar – que recusou abdicar um cêntimo do jackpot de cerca de 5 milhões de euros para financiar o seu partido; que foge da lei das incompatibilidades como o diabo da cruz; que recusa cortar reformas vitalícias e acabar com mordomias como a acumulações de empregos e de pensões, sem solução nem dó para a escalada do desemprego, da depressão, do suicídio, mas que, em contrapartida, não tem qualquer pejo em cortar a eito 15% da despesa na saúde, na educação, no socorro, na economia, nas prestações sociais, na cultura, no desporto.
Fingir-se parte da consternação dos madeirenses que sofrem na pele o arrepio da factura do programa de ajustamento económico e financeiro que Alberto João Jardim assinou é, mais do que hipocrisia, uma provocação, não tivesse decidido o governo regional lançar uma ofensiva de austeridade sobre as famílias em troca de um plano de salvação financeira para obter liquidez imediata. Dinheirinho fresco, venha ele de onde vier, para começar a por as contas públicas em ordem, para corrigir os excessos e os devaneios alucinantes das decisões governativas, sem critério nem moderação, para liquidar dívidas antigas, assumidas e não pagas, com mais anos do que os dedos de uma mão, entre outros compromissos que foram, de forma negligente e incompetente, enterrados por uma gestão do erário danosa.
Como afirmou Jardim, ontem mesmo, no final de um passeio de lancha, “um Governo que se preza não deixa as coisas chegar a este ponto” e “exerce a autoridade”. Obviamente que disse-o no contexto habitual, com baterias apontadas ao Governo da República e à ‘troika’, esses impositores da “assistência financeira estrangeira” que são, respectivamente o interlocutor da Madeira e o credor que propuseram resgatar o executivo de Jardim que, por sua vez, aceitou agarrar-se a esta bóia banhada a ouro e paga por todos nós, para evitar o naufrágio das finanças públicas. Foi incompetente na forma como administrou a Região e teve de ceder esse poder a Lisboa e a Bruxelas, para não continuar a gastar mais do que não tem e ainda nem caído um cêntimo do empréstimo na sua mão estendida e já rosna com a "autodeterminação". A independência, tal como a Autonomia que o governo regional entregou de mão beijada, são aspirações legitimadas pela voz do povo, não são brinquinhos para andar em mãos caprichosas a servir de instrumento político. É como a "revolução": pode partir o poder, mas não parte dele certamente.
Mas o partido que sustenta o poder continua a achar que é uma boa estratégia ensaboar a inteligência dos madeirenses com argumentos falaciosos para branquear a realidade enquanto a lancha governativa mete água. Que com os atestados de menoridade ao povo em pleno adro das igrejas consegue fazer embarcar a culpa e pô-la a milhas daqui para fora, aportando-a de preferência em Lisboa ou em Hamburgo. Vivemos uma democracia com mais de 30 anos mas há ainda uma máquina que se julga capaz de eliminar as nódoas da governação com lavagens cerebrais. Tal como em tempos de má memória… 
Fonte: DN Madeira

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