domingo, 17 de janeiro de 2010

'Basta' de meter o povo em sarilhos pessoais











Dizer que Sócrates "odeia a Madeira" é o aflito e estafado alarme demagógico que o presidente do governo regional costuma gritar quando ofende alguém do lado de lá e precisa de 'costas' porque o ofendido vem aí com a vingança. O presidente do governo regional sabe que Sócrates não odeia a Madeira, porque Sócrates não tem razões nenhumas para odiar a Madeira, não foram os madeirenses a chamar 'maricas', mafiosos e mentirosos aos políticos de Lisboa. Sabe, sim, que Sócrates o odeia a ele, porque tem razões para isso. O drama é que o primeiro-ministro, para se vingar das ofensas gratuitas do presidente do governo regional, tem de prejudicar a Madeira e os Madeirenses. Ou, dito de outra forma, o presidente do governo regional continua a ofender sem maneiras um primeiro-ministro de Portugal estando consciente de que a Madeira e os Madeirenses serão prejudicados por causa da sua conduta.


Claro que a táctica de chamar os triunfos a si e generalizar os problemas aos madeirenses só tem acolhimento entre a camarilha instalada, com os seus fundibulários, quadrilheiros, corifeus, beatério e clientes do tachismo, mais os cafres do carreirismo convictos de que a função pública fechará portas quando o rei partir. Fora dessa área, ninguém atura.

Logo em 2005, o presidente do governo regional decidiu tratar com o novo governo socialista à peixeirada, ao insulto. Julgou que Sócrates era tipo Guterres, a quem chamava 'mafioso' e prometia 'pontapés no traseiro' mesmo depois do perdão da dívida regional oferecido pelo então primeiro-ministro. Mas, um ano depois, José Sócrates veio a casa do adversário avisar: "É altura de dizer 'basta' e que o rigor financeiro é para todos". Chegava o 'garrote financeiro'. Que prejudicava a Madeira, mas que para o presidente do governo regional era o abrir de portas a eleições antecipadas e ao prolongar por dois anos um mandato que dissera ser o último. É disso que se trata: ambição pessoal e 'alapanço' ao poder, nem mais nem menos do que faz Sócrates.

Esta semana culminou com a surpresa de Sócrates em S. Bento: um novo 'basta!' ao dinheiro para o governo regional da Madeira. Espanto geral. Na véspera, quinta-feira, os deputados madeirenses haviam saído eufóricos de uma comissão parlamentar: os socialistas mostraram abertura para estudar as alterações propostas à Lei de Finanças. Faltou pouco para os ilhéus festejarem com champanhe. Mas, no dia seguinte, Sócrates esclareceu Manuela Ferreira Leite, em pleno hemiciclo: basta de dinheiro para a Madeira. Ora, os próprios deputados socialistas pasmaram com o 'recuo' ali anunciado pelo primeiro-ministro, o que confirma também o estilo prepotente e individualista do líder PS.

Grosso modo, os parlamentares madeirenses - com todas as cores a dar o jeito a Jardim em nome dos interesses do povo - queriam ver o Estado assumir, a coberto da dívida directa, o montante de cerca de 170 milhões de euros, total perdido em três anos pela Madeira à conta da nova LFRA. Daí adviria um alívio às finanças da Região. E evitar-se-ia o 'recado' de que 'os continentais continuam a mandar dinheiro para as festas, futebol e regabofe do Jardim'. Porque essa é uma ideia decididamente enraizada nos Portugueses.

Os deputados socialistas tinham pedido oito dias para pensar, enchendo de esperança o peito de Guilherme Silva e demais deputados madeirenses. José Sócrates poupou o trabalho de oito dias: "Basta!" Não há mais dinheiro para a Madeira.

É óbvio que o primeiro-ministro está interessado numa reacção em bloco da oposição centrada nas finanças regionais e no PEC, para se vitimizar, provocar eleições e reconquistar a maioria absoluta. E, se não a conseguir, que se governem e passem muito bem. A chantagem de Teixeira dos Santos, ao ameaçar aumentar os impostos caso haja mais dinheiro para a Madeira, faz parte da estratégia. Por um lado, atirar o País contra o presidente do governo regional. Por outro, reconquistar votos no Continente à custa dos cortes financeiros ao governo regional.

A oposição insular, desolada, desta vez acha que Sócrates não devia negar dinheiro ao presidente do governo regional porque, ao fazê-lo, está a prejudicar todo o povo da Madeira. E Sócrates tem para si que, ao desafogar as finanças regionais, estaria a premiar aquele que o ofende diariamente e a sustentar um regime caceteiro, interna e externamente. Uma 'pescadinha de rabo na boca' que penaliza não os dois teimosos politiqueiros mas o mexilhão já de si mergulhado na miséria. Curiosamente, o PS de Jacinto Serrão, que em 2007 se pôs ao lado de Sócrates, e daí uma derrota monumental, hoje atira-se ao primeiro-ministro, lado a lado com o presidente do governo regional.

A justa luta pela Autonomia, depois de cinco séculos de discriminação que só uns mentecaptos intelectualmente pretensiosos cá do burgo tentam negar, essa luta, retomada a 25 de Abril, rasteja hoje no pântano político-partidário, vulgarizada pelos apetites caciquistas, pela ambição, pelo desrespeito, prepotência, pelo instinto persecutório. A Autonomia foi traída por quem se julga no direito de a usar em projectos pessoais.

"Basta!", disse ele. Quando muito, mais endividamento. Para aumentar a pesada dívida regional. E cá continuam 250 milhões em calotes governamentais e municipais, a empresas e fornecedores, com implicações terríveis na economia insular, no desemprego e na dignidade das famílias. O governo regional não paga, ninguém investe, não há dinheiro a circular. Calote, esse novo ícone da Madeira Nova! O 'garrote' a sufocar e os responsáveis a pensarem em si.

Cuba também vive miseravelmente por causa do bloqueio e Fidel nunca se preocupou com isso. No Palácio não falta nada.

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