sábado, 19 de junho de 2010

A lei do chumbo. Os alquimistas da maioria PSD no parlamento produzem mais chumbo do que leis













A fuzilaria azucrinante largada pelos arcabuzes da tropa social-democrata continua a sacudir as faldas da Penteada onde os deputados regionais estanciam à espera das férias de Verão. É Jorge Moreira que acerta chumbo escaldadiço no debate anual sobre a Educação proposto pelo PCP. Ou então é o atirador Coito Pita, apoiado pelo municiador Savino Correia, a despejar fogo para liquidar o sonho socialista de uma comissão de inquérito à Comunicação Social. Rafaela Fernandes não poupa munições mal percebe agitar-se nas linhas inimigas um perigoso inquérito à Saúde.

'Debate recusado', 'proposta de decreto rejeitada', 'interpelação fica a aguardar', 'comissão de inquérito chumbada'. Os alquimistas de Jaime Ramos na Assembleia Legislativa produzem mais chumbo do que legislação. Se a ideia vem da oposição, não presta, nem vai a debate. E diz Jorge Moreira ser preciso "abrir as mentes" porque "o Muro de Berlim caiu há tanto tempo"!

Tudo porque, na óptica do sempiterno barão das Angústias, quem ganha eleições tem direito a mandar em tudo e não vale a pena a oposição andar por aí a cheiricar, que o fuzilamento é instantâneo e demolidor. E o que não tem debate debatido está.

Os deputados PSD alvejam as iniciativas da oposição como quem abate tordos cativos na armadilha. Os 'projectos de decreto' sucumbem um a um, sem verificação prévia da sua valia, e tratem do que tratarem: Estatuto da Carreira Docente, regime jurídico de comparticipações financeiras ao Desporto, subsídio de insularidade ao funcionalismo público, combate à evasão e fraude fiscal, carreiras e remunerações na Função Pública, acção social escolar, taxas a cobrar pela utilização do domínio público aeroportuário, jogo de Casino, taxas, clarificação do regime jurídico do CINM e impacto da praça no PIB regional, contribuição especial na extracção de inertes - é trabalho do PS que, com as iniciativas da restante oposição, fica para a estatística dos 'rejeitados' - salvo escassas excepções. A sorte da solicitação de 'debates parlamentares' não é melhor, porque a maioria foge a matérias complexas: desastre na Ribeira dos Socorridos, meios de combate à corrupção, concessões à Vialitoral e Viaexpresso, análise das transferências do Estado, negociação de fundos europeus 2007-2013, Marina do Lugar de Baixo, transportes marítimos entre a Madeira e o Porto Santo, Quinta do Lorde, extracção de inertes nas ribeiras do Faial, endividamento da Região, reconstrução pós-20 de Fevereiro, comunicação social, situação na Saúde. A oposição "não tem moralidade" para solicitar estes debates, costuma dizer a maioria. E está o assunto resolvido. 'Interpelações ao GR', versando temas como a situação do JM, Europa, Estatuto da Oposição, Sociedades de Desenvolvimento, desemprego, estado da Região e por aí fora, tudo igualmente rejeitado ou lançado às calendas gregas, salvo as excepções para disfarçar.

Com origem na oposição, a maioria só deixa avançar 'votos de pesar' ou 'louvores' a figuras destacadas - e mesmo assim não aprova todos eles. O parlamento, sendo a casa do debate, não debate. É centro de democracia e padece a ditadura. É a sede da Autonomia e arrasta-se curvada ante o chefe das Angústias. O Parlamento tem o papel de fiscal da governação, mas, em lugar de fiscalizar, é vigiado.

Honestamente, não há governos obedientes ao parlamento. Então cá! Os deputados do PSD-M a repreenderem o GR pela suicida política financeira! A apontarem a não-governação das Secretarias. A recomendarem parcimónia aos turistas Jardim, Brazão de Castro e Ventura Garcês. Mas a verdade é que Francisco Assis só faz defender Sócrates. Os deputados socialistas espanhóis não atacam Zapatero. O grupo parlamentar do PS-Açores esconde os erros palmares de Carlos César. O ascendente dos parlamentos sobre os governos é ficção. Outra das hipocrisias da política. Mas há regras para distinguir o poder legislativo do executivo. Práticas democráticas que justificam o regime parlamentar. Foi quando dispunha de uma maioria absolutíssima que Sócrates se disponibilizou para os debates sobre o estado da nação e para encurtar a sua periodicidade.

O chefe de cá foge ao confronto, tal como o seu braço armado faz no Parlamento para calar a oposição e evitar agitação popular. Assim, os eleitores das minorias, que também trabalham e pagam impostos, estão impedidos de ver as suas ideias projectadas na Assembleia. Será que o parlamento é do PSD? Não devia ser do povo que votou PSD e do resto do povo que votou na oposição?

A discriminação, parece, ainda não atingiu o limite. O triunfo eleitoral em Maio de 2007 espicaçou a insaciável soberba do patrão ilhéu. Com os votos ainda quentes, ameaçou desmantelar um certo 'porreirismo". Em seu entender, os partidos da oposição estariam a ser tratados com demasiada cortesia e amizade. A fúria da vitória inspirou então o desfolhar dos poucos princípios do parlamentarismo ainda vivos. O PSD quis extinguir os grupos parlamentares com apenas dois assentos. Excluir os pequenos partidos das comissões. Impedir a rotatividade de deputados. Reduzir a zero o tempo de palavra dos adversários. Cortar acessos a figuras regimentais como o debate e o inquérito. Dizimar a declaração de voto. Umas agressões passaram, outras não houve meio de as impor. E interroga-se o deputado Tranquada Gomes, corporizando o diamantino coração social-democrata: "Mas onde é que há parlamento com um regimento tão bondoso?!"

Talvez, como diz Miguel Mendonça, a ALM, longe de "um primor de virtudes", não seja também "um reduto de malandragem". Alguns deputados da maioria, admita-se, trilharão o caminho do videirismo e do panegirismo por razões fortes demais. Mas o caso é que aquela "casa de loucos", citando o barão das Angústias, custa ao povo explorado, faminto, dominado e desempregado uns suculentos 17 milhões de euros ao ano. Um "porreirismo" caro a levedar nas entranhas e na paciência do vulgo. Até um dia. São 3,4 milhões de contos para alimentar a clientela devorista e despachar chumbo quando a oposição tenta debater o estado da albergaria rodeada de água por todos os lados. Mas a chumbada também está a atingir e a carcomer as vigas de suporte da democracia.


E não é para ficar por aqui. O PSD está a engenhar maneira de meter na lei eleitoral os mínimos de 5% para eleição de um deputado. Fazemo-nos entender?

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