Há
um assunto muito inquietante entre nós, sobre o
qual já há muito tempo que desejo expor algumas ideias. É um assunto que
merecia um pronunciamento oficial da nossa Igreja Católica da Madeira. Mas dado
que de assuntos quentes o sr. bispo foge, então, digo o que penso, não como
padre, mas como cidadão que se inquieta e perturba com coisas que se apresentam
cheias de boa vontade, mas que se revelam no fim dádivas que de generosidade
não têm nada.
Uma
grande parte dos partidos políticos da nossa praça resolveram dedicar-se à
«caridade». Alguns grupos parlamentares pegaram numa migalha da subvenção
estatal (vulgo Jackpot) da Assembleia Regional da Madeira para distribuírem
cabazes de compras de supermercado e vales-farmácia. É, no caso do CDS, o «projecto
solidário» que tem como destinatários idosos, famílias carenciadas e os jovens
do arquipélago. Nos próximos 18 meses, distribuirá 15 mil cabazes alimentares e
14 mil vales-farmácia na região. Feitas as contas corresponde a uma ninharia
esta distribuição. Outros partidos também à sua medida já fizeram o mesmo. O
PSD promove viagens a preço de saldos (1 euro) para a sua festança no alto da
serra. O povo está deslumbrado com tudo isto. A caridade a este nível está na
moda. Mas, «Timeo Danaos et dona ferentes» (receio os gregos mesmo até
quando eles me dão dádivas). Esse, algum povo, que se deslumbra com estas
dádivas, devia pensar que já está pagando tudo isto com suor e lágrimas. A vida
está dura para alguns e não se aliviará esta dureza com caridades partidárias,
mas com justiça.
O
que penso, concretamente, sobre tudo isto. Se tivéssemos um povo consciente do
que está verdadeiramente causa, recusava tudo e colocava os partidos políticos
na ordem e no seu devido lugar. Os votos não são objecto de compra e venda. Um
povo consciente e esclarecido não se vendia por um prato de lentilhas, que os
partidos políticos teimam em servir ao povo. Jogos e
joguetes da manipulação que nos enojam sobremaneira.
Mas
qual caridade e solidariedade com esta migalhas… Chama-se a isto comprar votos
com o dinheiro dos contribuintes. Cumprimentar com o chapéu alheio. Talvez me
calasse se esta caridade fosse feita com o dinheiro dos salários dos deputados.
Porque, se entendem e nós também entendemos que o dinheiro que se distribui aos
partidos políticos, é muito e que não o irão gastar na totalidade, então,
devolvam-no à procedência, serve para outra coisa, porque este dinheiro não se
destina a caridade, mas, sim ao funcionamento da democracia. Se não o gastam
devolvam-no ou não o recebam, serve para outros fins.
Obviamente
que todos os cidadãos e todas as instituições devem praticar a caridade, embora
entenda que no caso dos partidos políticos, nós os sustentamos a peso de ouro,
servem para promoverem o bem comum e a justiça e não de forma alguma para
praticarem a caridade.
Alguns
dirão que esta minha posição demonstra que a caridade é monopólio de algumas
entidades ou pessoas e quiçá da Igreja Católica, nada disso, longe de mim
pensar isso neste momento. Até acho que a verdadeira caridade, é aquele que se
pratica no anonimato, entre famílias, entre vizinhos… Esta caridade cresce de
forma interessante por todo o lado. E é a verdadeira caridade.
Nesta
caridade partidária, realizada com o dinheiro dos
nossos impostos, anunciada em altas parangonas mediáticas, não confio nada
nela, serve para comprar votos, tapar os olhos do nosso povo e no fim é
humilhante para os pobres. Pelo que tenho observado, alguns daqueles que os
partidos políticos têm ajudado, não nego que precisam realmente, mas outros,
sem vergonha, comem dos partidos e de todas as instituições que se dedicam a
este trabalho da caridade. Até já chamei a atenção a pessoas que vi nas
fileiras da caridade partidária, que não precisam nada daquela ajuda.
Bom,
seria interessante que os partidos e todas as pessoas que se dedicam a esta
actividade de ajuda aos outros, especialmente os mais necessitados, o fizessem
com o seu dinheiro e na maior da descrição. A verdadeira pobreza está escondida
e não se chega à frente, precisamente, porque muitas vezes é humilhada na sua
dignidade, porque quem ajuda não se contém na discrição e no respeito na ajuda
que presta. Não seria interessante a frase do Evangelho, («Que não saiba a
vossa mão esquerda o que faz a direita» Mt 6, 3), estar presente nesta
moda perigosa que pode nos conduzir a uma banalidade ou quiçá a um caos
caridoso que ao invés de ajudar, segue a lógica da fartança e da chulice? –
Chega. Senhores dos partidos políticos, mais respeito para com os pobres, usem
os dinheiros públicos para a promoção da justiça, promovam o emprego e não
precisamos mais de encontrar gente a fazer caridade e outros de mão estendida,
humilhados perante a pseudo benevolência dos partidos políticos nem de ninguém.
Uma sociedade justa é o que se deseja.
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